Passados cinco anos e meio do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG), os familiares das 272 vítimas ainda não encontraram justiça nos tribunais.
Passados cinco anos e meio do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG), os familiares das 272 vítimas ainda não encontraram justiça nos tribunais. Nenhum dos acusados pelas mortes foi condenado até agora. O processo mais antigo na esfera criminal depende do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que em 12 de abril passado travou a ação por meio de uma liminar sem prazo de análise pela 6ª Turma.
Com risco de alguns dos crimes prescreverem, sem punição aos responsáveis, representantes da associação de familiares das vítimas Avabrum foram à sede do STJ na quarta-feira (26) para ressaltar a urgência do julgamento. Mães de duas das vítimas e os advogados dos familiares foram ao gabinete do ministro Sebastião Reis Júnior, que concedeu a liminar que interrompeu o processo em abril, mas não conseguiram audiência. O ministro está fora do país, no 12º Fórum Jurídico de Lisboa, do instituto IDP – fundado pelo decano do Superior Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes.
"Batemos nas portas, com muita tristeza, né? E ouvimos que só recebem os advogados, enquanto nós, cidadãos, as vítimas, não somos recebidas, não somos ouvidas", disse Maria Regina da Silva, que esteve na sede do STJ. Ela é mãe de Priscila Elen da Silva, vítima do rompimento que trabalhava no setor de manutenção de mecânica na mina do Córrego do Feijão, da Vale. À época do crime, ela trabalhava havia dez anos para a mineradora.
Dona Jacira Francisca Mateus Costa foi à sede do STJ cobrar justiça pela morte do filho Thiago Mateus Costa, mecânico da Vale por 13 anos, que também trabalhava na mina do Córrego do Feijão. "Lá em Brumadinho as pessoas olham pra gente dizendo que somos 'bobos' de achar que vai ter justiça, de achar que alguém vai ser julgado. A gente insiste, mas quando vem pra Brasília e vê esses gabinetes vaziosâ¦", lamentou Costa.
Outro dos gabinetes visitados foi o do ministro Rogério Schietti Cruz, também membro da 6ª Turma. Cruz, Reis e outros dez ministros do STJ foram para o evento organizado pelo IDP em Lisboa, um dos motivos de um esvaziamento geral de gabinetes dos Três Poderes em Brasília (DF) nos últimos dias.
"Aquele rompimento de barragem que aconteceu naquele dia continua para nós. É como se fosse hoje, ontem, todos os dias. O processo 'anda' e depois 'para', o tempo passa e cresce o medo de que chegue num ponto em que não dê para fazer mais nada. [â¦] Nenhum de nós quer que essas pessoas [réus] sejam condenadas sem culpa. A gente quer que elas sejam julgadas", disse Silva.
A Avabrum auxilia a acusação no caso, a cargo do Ministério Público Federal (MPF). No último dia 7 de maio, o MPF se manifestou no processo, pedindo que o STJ retome o prazo original para a defesa dos réus. O processo corre na 2ª Vara Criminal da Justiça Federal em Belo Horizonte, que estendeu a suspensão do prazo à defesa de todos os réus, incluindo a Vale, a partir da liminar do ministro Sebastião Reis Jr., do STJ.
A pausa indefinida no prazo tem origem em documentos relativos ao rompimento da barragem apresentados à agência reguladora do mercado de capitais dos Estados Unidos, ligada ao governo norte-americano, que, segundo os réus, poderiam influenciar no julgamento da Justiça brasileira.
Para o MPF, a interrupção dos prazos não se justifica, porque os réus sequer juntaram os documentos obtidos nos Estados Unidos à ação. "Mesmo assim, a defesa já tem pleno acesso à documentação integral", alega o órgão, que defende ainda não haver "norma capaz de impor a paralisação" do processo, considerando-se os fatos.
"Caso a documentação [vinda dos Estados Unidos] realmente venha a ser juntada aos autos, basta assegurar à defesa a oportunidade de se manifestar sobre ela em prazo proporcional", afirma o MPF – que pede a queda da liminar e a retomada do caso.
"Entramos com recursos contra a liminar concedida em abril, mas nenhum desses documentos foi apreciado até agora. Por isso fomos pessoalmente ao STJ, para explicar o caso aos ministros", disse o advogado Danilo Chammas, parte da banca que representa os familiares das vítimas.
"Por mais que saibamos da necessidade e do direito à ampla defesa, infelizmente uma liminar como essa acaba sendo muito generosa com os réus. Por outro lado, o dever do Estado de investigar, processar e punir aqueles que violam direitos humanos e ambientais acaba prejudicado", afirmou o advogado da Avabrum.
A Agência Pública procurou o STJ para saber se há previsão de retomada do caso, com análise dos recursos do MPF e dos familiares no processo. O STJ afirmou que, "até o momento, não há previsão de data para julgamento".
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