“Todo mundo precisa de arte.
“Todo mundo precisa de arte.” A frase da professora Cecília Borges, inspirada nas ideias de Augusto Boal, reflete a importância universal da expressão artística. Doutora em artes cênicas, ela ministra a disciplina Prática de Montagem em Educação na Universidade de Brasília (UnB), que tem um objetivo duplo: preparar seus alunos para a docência e levar o teatro à comunidade.
Para isso, os estudantes desenvolvem suas habilidades pedagógicas organizando oficinas gratuitas de teatro abertas ao público, aprendendo a ensinar enquanto promovem o acesso à arte.
A turma, na qual os alunos de Cecília ensinam artes cênicas a outras pessoas, já reúne mais de 60 participantes de diferentes perfis, de crianças a idosos. Segundo a professora, essa vivência ajuda os estudantes a “aprenderem a lidar com a diversidade”, tanto de mentes quanto de corpos. “É uma experiência valiosa para quem seguirá a carreira docente, porque o ensino do teatro nem sempre acontece em um contexto escolar”, explica.
Quem teve a ideia de criar a oficina para a comunidade, foi Flora Scartezini, uma das sete estudantes que cursam a disciplina neste semestre. Ao Metrópoles, ela defende que todas as pessoas deveriam ter a oportunidade de conhecer o teatro. “Eu pensei que seria muito legal que a gente desse essa chance para todo mundo, não só para um público específico, mas para quem estivesse com vontade de conhecer e pudesse encontrar aqui um espaço legal para explorar”, detalha.
Uma das pessoas que buscou as oficinas gratuitas foi a ceramista Giselle Raízes. Aos 43 anos, ela entrou nas aulas junto com os dois filhos, Bambu, de 12 anos; e Tauã, de 8. As crianças foram o principal motivo para que ela buscasse a experiência, além de querer usar os recursos do teatro para melhorar a própria comunicação.
“Meu filho de 12 anos gosta de rimar e gravar vídeos, então acho que o teatro pode ajudá-lo a desenvolver esses interesses. Meu filho de 8 anos é tímido, muito recolhido nele mesmo. O teatro seria uma chance de trabalhar esse lado, para que não se desenvolva uma carcaça que o impeça de ser”, explica.
Giselle também foi a responsável por levar uma quarta aluna para a oficina, a irmã dela, Mu Magalhães. Formada em biologia e gastronomia, a carioca de 57 anos descobriu a paixão pela atuação após participar de um curta-metragem feito pela filha. “Adorei e decidi que queria fazer isso mais vezes. Muitas vezes! Caiu como uma luva essa oficina! Se tivesse mais de uma vida, em uma delas seria atriz”, compartilhou.
Quem também decidiu se arriscar na oportunidade foi a estudante de filosofia Amanda Medeiros — que sempre sonhou em estudar na UnB e conseguiu realizar isso agora. Ela fez curso de teatro aos 18 anos, uma oficina para não atrizes em 2024 e aproveitou para seguir o desenvolvimento nessa nova oficina.
“É incrível a possibilidade de diversidade de corpos, histórias e experiências compartilhadas. Acredito também no potencial terapêutico e transformador que a arte nos proporciona”, avalia Amanda, que é professora de história e pretende cursar artes cênicas quando concluir o curso atual.
A turma coordenada pelos sete alunos de Prática de Montagem em Educação é onde a baiana Maria Verônica Pereira, de 64 anos, resolveu curar uma dor do passado. “Amo teatro desde muito cedo e era muito frustrada por não ter sido artista de teatro”, explica.
Servidora pública aposentada, a baiana é estudante de biblioteconomia da UnB e ingressou na universidade pelo vestibular exclusivo para pessoas com mais de 60 anos. Ela conta que gosta muito de teatro e descobriu a oficina por meio de colegas com quem fez um curso na mesma área, no Espaço Renato Russo, para pessoas 50+.
O estudante de psicologia Diego Moreira viu na oficina uma oportunidade de retomar sua paixão pelo teatro. Ele conta que, apesar de sempre ter amado a arte, nunca teve apoio ou permissão da família para praticá-la. Ainda assim, atuou em algumas companhias teatrais e chegou a passar uma temporada no exterior. Agora, decidiu finalmente realizar seu sonho.
“Fiz esse compromisso comigo de que voltaria para o teatro e que isso seria algo essencial. E queria mais do que trabalhar como ator freelancer, queria ter fluência. Hoje o teatro é uma parte inegociável da minha rotina e não consigo me ver fora disso”, detalha.
O agente de portaria Adonielton Passos é outro aluno da oficina. Aos 43 anos, ele conta que aprimorou a vontade de fazer teatro após um workshop na Escola Wolf Maia, no Rio de Janeiro. No entanto, a elitização dos cursos oferecidos na cidade o impediram de se aventurar antes.
“Tem algum tempo que eu desejo aprender, ser um ator, mas, infelizmente, as aulas de teatro que encontrei no Distrito Federal são muito caras. E, no momento, não tenho condições de arcar com isso”, explica.
Quem também aproveitou a oportunidade foi Fabíola da Costa Farias. A pedagoga de 41 anos conta que sempre brincou com o jogo cênico e fazia interpretações junto com os oito irmãos quando ainda era criança. Ela também passou por aulas de teatro na escola, mas ficou décadas fora dos palcos.
“Vinte anos depois, surgiu a oportunidade de fazer essa oficina, de pisar nesse solo sagrado que é a UnB e o teatro. É uma oportunidade de conhecer pessoas, fazer conexões, e sem pretensão nenhuma de questão de atuar ou de ter visibilidade, mas com a pretensão de ter uma liberdade corporal.”
Em busca de uma reconexão com o teatro, a dançarina Ana Sótera viu na oficina uma chance para isso. “Havia um tempo que não tinha a experiência de ter aulas de teatro, estava dentro de processos teatrais, mas não tendo aulas, então sentia falta disso”, conta.
Ana Luiza Vieira aprendeu com o pai a apreciar o teatro. Quando pequena, era sempre levada para ver peças e percebeu a falta que isso fazia durante o período de pandemia. No pós, fez com o pai uma maratona de teatro e passou a ver peças, pelo menos, uma vez por mês.
Ela conta que teve certeza de que queria trabalhar com teatro musical após assistir uma peça e decidiu fazer um curso de teatro. “Foi uma descoberta pessoal muito importante, e realizei meu sonho. Subir no palco, interpretar, cantar, me expressar faz parte da Ana Luiza, me faz sentir completa. E eu nunca vou parar de fazer arte”, conta a estudante de biologia, que pretende se profissionalizar nas artes cênicas.
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