Os processos de fusões e aquisições (M&A, na sigla em inglês) estão ganhando cada vez mais espaço no pipeline do agronegócio.
Os processos de fusões e aquisições (M&A, na sigla em inglês) estão ganhando cada vez mais espaço no pipeline do agronegócio. Levantamento feito pela consultoria Auddas aponta que o interesse dos fundos de investimentos e empresas em operações de M&A, em geral, deve aumentar 20% este ano em relação a 2023. Entre os setores do mercado brasileiro que mais despertam interesse dos investidores e empresários, está o agro, sobretudo nos segmentos de bioinsumos, beneficiamento de sementes e inovação, com o crescimento das agritechs.
Um dos atores mais atuantes no cenário de M&A do agronegócio no Brasil é a Lavoro, distribuidora de insumos agrícolas e primeira empresa do segmento na América Latina a ser listada na Nasdaq (National Association of Securities Dealers Automated Quotations), bolsa dos Estados Unidos focada em tecnologia. Em dezembro passado, ela concluiu a aquisição do controle acionário da Coram, varejista no mercado de insumos agrícolas com sede em Itupeva (SP).
O plano de expansão envolvendo a aquisição de empresas foi anunciado em março de 2023, logo a Lavoro após concluir a listagem na Nasdaq. No mesmo mês, a empresa comunicou a aquisição do controle acionário da Referência Agroinsumos, estabelecida em Dom Pedrito (RS). Foi a primeira operação de distribuição de insumos da Lavoro no Rio Grande do Sul.
A distribuidora gaúcha comercializa marcas como Bayer e Corteva, com foco em defensivos químicos e sementes, além do portfólio de fertilizantes granulados, em sete unidades no Rio Grande do Sul. Uma das principais distribuidoras de sementes de arroz híbrido no território gaúcho, a Referência Agroinsumos é parceira da Ricetec, considerada uma das maiores produtoras de sementes do mundo. A distribuidora vem apresentando crescimento acima de 40% nos últimos anos.
Na avaliação de Luiz Spinardi, head de M&A da Lavoro, o mercado de distribuição de insumos vem experimentando uma onda de consolidações desde 2016, com mais de 60 aquisições. "Metade foi realizada pela Lavoro", diz Spinardi.
Mesmo diante do crescimento de aquisições, o mercado agro ainda está muito fragmentado, o que significa que há espaço para consolidações, na visão da Lavoro. "Os dez maiores players têm menos de 40% do mercado. Nos mercados, maduros como os Estados Unidos, esse número passa de 70%. Sendo assim, acreditamos que ainda tem bastante espaço para consolidação", observa Spinardi.
Por outro lado, a fragmentação do mercado traz o desafio de encontrar as empresas e os sócios mais adequados para o processo de M&A. Na avaliação de Spinardi, a grande maioria das empresas é de pequenas e médio porte, muitas delas familiares, portanto, menos preparadas para mudar de patamar.
Outro desafio é a integração de culturas empresariais. "Mas, ao mesmo tempo, uma das oportunidades para transformar pequenas e médias empresas familiares em plataformas líderes no setor", diz Spinardi.
O crescimento da trajetória de M&As no agronegócio no Brasil é diretamente proporcional aos desafios também na esfera jurídica. Renata Homem de Melo, líder na prática de Societário e M&A no FAS Advogados in cooperation with CMS, ressalta que o setor precisa amadurecer em termos de governança.
A advogada chama a atenção para o excesso de informalidade. Embora esteja diminuindo, ainda é um ponto crítico e com potencial de prejudicar as negociações. Segundo ela, essas questões são especialmente delicadas quando as negociações envolvem investidores estrangeiros, que buscam mais transparência e segurança jurídica.
"Muitas empresas rurais, especialmente de pequeno e médio portes, não possuem regras claras de governança e para se adaptarem ao recebimento de um aporte de capital ou entrada de um sócio. Então precisam se preparar previamente para passarem por um processo de M&A com sucesso", diz Melo.
Na visão das empresas que participam dos processos de consolidação, eles abrem caminho para o crescimento sustentável. Para o head de M&A da Lavoro, as grandes plataformas puxam esse movimento, por serem, na maioria das vezes, empresas listadas em bolsa ou pertencentes a grandes grupos listados, que são mais exigentes em termos de governança e profissionalização. "Isso acaba beneficiando todo o setor, pois estabelece padrões mais elevados de operação e gestão", diz.
Outro ponto de atenção para as empresas que atuam no segmento do agronegócio, segundo especialistas no mercado de M&A, é o alinhamento e a conformidade com políticas ESG (sigla em inglês para ambiental, social e governança). Renata Homem de Melo observa que a adesão a essas políticas vem se tornando uma pressão crescente no agronegócio, uma vez que os investidores têm favorecido empresas que operam de forma sustentável e transparente.
Spinardi ressalta que, em empresas consolidadoras, a análise de crédito ultrapassa avaliações financeiras, observando se a produção não está em áreas de preservação ou apresentam desmatamento ilegal. "A partir dessa análise rigorosa, é possível implementar a rastreabilidade da soja, por exemplo. Esse processo de rastreabilidade não só assegura que os produtos atendam a padrões de sustentabilidade, mas também fortalece a confiança dos consumidores e dos mercados internacionais", diz
A lupa dos investidores apontada para agenda ESG no agronegócio tem favorecido as empresas que desenvolvem bioinsumos ou apresentam potencial de inovação e melhoria de eficiência energética na produção agrícola. A tendência é que os investidores continuem a focar em empresas que demonstrem um forte potencial para adoção de novas tecnologias e práticas sustentáveis, áreas definidas como chave para o futuro do agronegócio, diz Melo.
Marco França, sócio da Auddas, observa que a busca por produtividade vem aquecendo o movimento de M&A em empresas focadas no beneficiamento de sementes e biodefensivos. Por outro lado, França sinaliza que o ciclo de revendas passa por um momento de avaliação. "O processo de consolidação de revendas vive agora um período de foco na gestão e resultados, diz França.
Na visão do consultor, o desafio atual é entender o próximo ciclo do agronegócio, além de ser necessário um trabalho mais intenso de ajuste e arrumação da casa. França ressalta que o agronegócio tem passado por bastante volatilidade, quebra de produção e alteração de margens no último ano.
"Esse cenário é decorrente de tormentas relacionadas a preço de commodities, eventos climáticos, e desastres naturais", afirma França.
Outro fator que vem interferindo em M&As no agro é o crédito com lastro insuficiente. Isso reflete negativamente em operações de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs). "Esse cenário impulsionou diversas operações de recuperação judicial de produtores agrícolas, punindo simultaneamente credores e fornecedores. Além de machucar a credibilidade do setor na Faria Lima, que também está aprendendo com esse estresse", diz França.
Diogo Luchiari Fructuoso, sócio e Chief Marketing Officer Agronegócio da Macfor, agência de marketing digital full servisse, enxerga os processos de recuperação judicial como um caminho para a entrada de novas empresas no mercado brasileiro.
"O movimento de M&A, associado ao crescimento das recuperações judiciais no Brasil, promete movimentar ainda mais o mercado agro em 2024. De um lado, temos empresas estrangeiras interessadas em se consolidar na produção de alimentos no Brasil. De outro, enfrentamos um cenário desafiador para empresas locais, devido à queda dos preços das commodities e ao alto estoque", afirma.
No curto prazo, o setor enfrenta queda nos preços dos grãos e insumos agrícolas, avalia Spinardi. A expectativa é que essas pressões econômicas impactem o ritmo de aquisições, levando a uma desaceleração frete a anos anteriores. "Os ciclos econômicos são transitórios e, à medida que o mercado se estabilizar e se recuperar, é esperado que a onda de consolidação retome força".
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