A indústria de criptomoedas, uma instituição fundada no princípio de afastar as “mãos gananciosas” do governo da moeda do povo, está em alta. O motivo? Talvez finalmente tenham convencido o governo a colocar suas mãos no bitcoin.
O preço do bitcoin disparou mais de 30% desde a eleição do republicano, quebrando repetidamente seu recorde histórico e atingindo o pico (até o momento) em torno de US$ 92 mil. O preço mais que dobrou desde o início do ano, e alguns analistas projetam que pode chegar a US$ 100 mil até o final do ano.
O mercado de ações mais amplo também está em alta, enquanto Wall Street respira aliviado com os resultados das eleições dos EUA, que chegaram mais rapidamente e com mais clareza do que o esperado. Mas as criptomoedas, que muitas vezes acompanham o movimento das ações, tendem a ter picos mais altos e quedas mais profundas, o que atrai as apostas nesse mercado e, esta semana, as apostas estão fervendo.
Grande parte do entusiasmo impulsionando o rali do bitcoin está centrado nas expectativas de que o presidente eleito Donald Trump adotará uma agenda pró-cripto, conferindo legitimidade a uma indústria que há anos é descartada pela classe de investidores tradicionais e bloqueada por reguladores.
"O rali que estamos vendo é mais uma normalização do que deveria ser a dinâmica do mercado em torno do setor de criptomoedas," disse Faryar Shirzad, diretor de políticas da Coinbase, nesta terça-feira (12). "Acho que o que estamos vendo é uma demonstração ao vivo de quanto os ventos políticos que enfrentamos nos últimos quatro anos reprimiram os mercados de criptoativos."
Trump, que até 2021 dizia que as criptomoedas "pareciam uma fraude", deu uma virada de 180 graus no setor no início deste ano, em uma aparente mudança de postura que coincidiu com a recuperação do setor após o desastroso ano de 2022 (marcado, entre outras coisas, pelo colapso da exchange de criptomoedas FTX e a acusação criminal de seu fundador, Sam Bankman-Fried).
Parte dessa recuperação envolveu uma mobilização política liderada pela Coinbase e dezenas de milhões de dólares em lucros com criptomoedas sendo direcionados a várias campanhas pelo país, tornando-se a indústria com maiores gastos no ciclo eleitoral de 2024.
Em uma grande conferência de bitcoin durante o verão, Trump fez duas promessas importantes ao seu público: Primeiro, ele demitiria Gary Gensler, presidente da Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC) e arqui-inimigo da indústria. Tecnicamente, o presidente não pode demitir o presidente da SEC, embora Gensler seja amplamente esperado para renunciar, como é costumeiro com a entrada de uma nova administração.
Segundo: ele criaria uma reserva nacional de bitcoin ao impedir que o governo vendesse os ativos apreendidos em casos criminais.
A segunda promessa de Trump foi um pouco mais vaga, e pode muito bem ter sido apenas um aceno para evitar ser ofuscado por Robert F. Kennedy Jr., que no dia anterior prometeu um "Fort Knox de bitcoin" ainda mais ambicioso para tornar o governo dos EUA o maior detentor de bitcoin globalmente.
De qualquer forma, o resultado é efetivamente o mesmo: o governo dos EUA sustentaria o preço do bitcoin, um ativo construído sobre a ideia de que governos não deveriam ser capazes de manipular o valor das moedas para atender aos seus interesses.
Perguntei a vários especialistas nesta semana sobre essa aparente incoerência na natureza das criptomoedas.
"Ter o governo estabelecendo uma reserva estratégica é completamente incongruente com grande parte do lado ideológico, que deveria ser sobre descentralização e antiautoritarismo," disse Molly White, jornalista e crítica proeminente do setor de cripto.
"Mas acho que existe uma crença entre alguns entusiastas das criptomoedas que dizem: 'Bem, tudo bem, isso não faz realmente parte da ideologia, mas faz o preço subir.'"
A interpretação mais generosa pode ser que, neste momento, o único caso de uso real das criptomoedas seja criar valor que possa ser negociado e apostado. Ou, como Zeke Faux, da Bloomberg, colocou na semana passada: "usar dinheiro real para apostar nos preços de moedas inventadas."
Num nível básico, uma reserva estratégica "legítima totalmente o bitcoin como uma classe de ativo com significância sistêmica global," disse Yesha Yadav, professora de direito e vice-reitora da Universidade de Vanderbilt, em um e-mail.
"Isso, por si só, representa uma enorme vitória simbólica para a indústria de criptomoedas que, há dois anos, estava sendo considerada como morta no setor."
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CNN Brasil